Dicas de séries por Raquel Baracat - Ginny & Georgia (Netflix)
Novo sucesso da Netflix quer ser Gilmore Girls da nova geração
Ginny & Georgia estreou na Netflix que precisou de dois dias para alcançar o pódio de série mais assistida pelos usuários da plataforma nos Estados Unidos. O sucesso pode estar relacionado com as semelhanças a outra produção, muito amada nos anos 2000 e que também está no streaming: Gilmore Girls.
Todos os elementos da série veterana estão presentes no novo título: uma mãe jovem e de mente aberta, uma filha adolescente responsável e estudiosa, ambas divididas entre dois romances diferentes - e, sim, um interesse amoroso de cada uma também anda de motocicleta.
Isso sem contar as referências à cultura pop, diálogos rápidos e inteligentes e comida fast-food em excesso. Tudo em uma cidade pequena, com moradores que sabem tudo sobre as vidas uns dos outros. No primeiro episódio, há até uma referência direta a Gilmore Girls.
Todas as semelhanças parecem estar lá propositalmente, colocadas pelas criadoras Debra J. Fisher e Sarah Lampert, tornando impossível não se comparar Ginny & Georgia a Gilmore Girls e outros sucessos adolescentes. Isso ajuda também a atrair espectadores mais velhos - e nostálgicos - para além da geração Z, a qual a maioria das comédias românticas da Netflix tem se direcionado.
Ao mesmo tempo, em Ginny & Georgia as personagens enfrentam questões sombrias que nunca seriam colocadas para Rory e Lorelai, como violência doméstica, problemas com saúde mental e segredos obscuros de família. Esses elementos seriam interessantes na narrativa, se tivessem sido colocados de um jeito próprio, mas é aí que a série se perde.
Em vez de encontrar sua própria identidade ou originalidade, Ginny & Georgia flui entre muitas outras histórias que já foram contadas e encontra dificuldades para dar personalidades a suas protagonistas. Georgia (Brianne Howey), por exemplo, é claramente uma mãe millennial (geração de pessoas nascidas entre o meio dos anos 1980 e o fim dos anos 1990), que alimenta as fantasias dos filhos com brincadeiras sobre Harry Potter. Mas seu comportamento é basicamente de charlatões de novelas dos anos 1960: desonesta, mentirosa e até ladra - tudo mascarado por um sotaque encantador do Alabama.
É possível, é claro, associar o passado difícil da personagem, em um lar violento, com suas ações. Há no roteiro uma tentativa de criar uma anti-heroína, como em Disque Amiga para Matar (que tem duas). Mas se torna difícil simpatizar com Georgia quando ela mostra pouquíssimo remorso e perambula pelo quarto dançando com armas na mão durante uma noite de insônia - isso ainda deveria ser um drama leve, certo?
Já Ginny (Antonia Gentry) é uma caricatura de Rory Gilmore, principalmente quando se trata de responsabilidade - com ela mesma e com o irmão mais novo. Porém, as criadoras da série não aproveitaram um grande diferencial que poderia aprofundar a história de Ginny, que é a questão racial.
Filha de um homem negro, ela não é tão parecida fisicamente com Georgia e passa por dificuldades que muitas jovens negras mestiças podem se identificar. Ela mesma conta que sempre a acham muito negra para as garotas brancas e muito branca para as garotas negras.
Essa dificuldade de socialização está presente na série, desde a colega que não sabe pentear o cabelo da garota até a aluna que não para de falar sobre ter “bebês mestiços”, como se criar crianças negras fosse algum tipo de divertimento.
Ao mesmo tempo que essas questões são colocadas, elas também ficam perdidas na narrativa e não são aprofundadas. Parece que a ideia era ter uma nova Rue, personagem de Zendaya em Euphoria - uma protagonista com seus próprios problemas e que por acaso é negra. Na série da HBO, a negritude de Rue não é uma questão ou impedimento em sua história. Mas isso não quer dizer que outras personagens não possam lidar com tais tópicos. Ginny poderia.
Ao menos Ginny se torna mais identificável com a audiência ao protagonizar momentos de insegurança (como toda adolescente) e uma primeira vez constrangedora e desconfortável.
Ainda assim, no núcleo principal da série, o das adolescentes, chovem ainda mais referências gratuitas a outras produções, que nunca se realizam por completo: às vezes parece que a série vai emplacar algo parecido com Pretty Little Liars, às vezes, com As Gatunas. Há momentos divertidos que poderiam ser de Sex Education, e outros mais sérios que parecem saídos de The O.C. O problema é que nunca, de fato, parece Ginny & Georgia.
Fonte: https://www.omelete.com.br/netflix/criticas/ginny-georgia-netflix