Estudo traz bons resultados para mulheres com câncer de mama que querem engravidar
Pesquisa indica segurança em interromper a endocrinoterapia para liberar as pacientes para a gravidez
Estudo divulgado pelo New England Journal of Medicine, uma das principais publicações da área médica do mundo, revela resultados animadores para mulheres com câncer de mama que desejam ser mães. Realizada com um número expressivo de pacientes de 42 anos ou menos, em estadios I, II e III da doença, a pesquisa indica a possibilidade de interromper a endocrinoterapia em 18 a 30 meses, liberando as mulheres mais cedo para engravidar. O estudo também mostra relevância por acompanhar gestações bem-sucedidas no grupo de pacientes submetido à abreviação deste prazo no tratamento de bloqueio hormonal.
O Brasil vem registrando um aumento importante no número de casos de câncer de mama entre mulheres jovens. Estudo recente, realizado pelo Instituto de Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), unidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, mostra que a proporção de pacientes com menos de 40 anos foi de 7,9% em 2009, passando a 21,8% em 2020.
À medida que os casos de câncer de mama crescem entre as mais jovens, o número de mulheres que opta por engravidar mais tarde no Brasil também aumenta. Segundo levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no prazo de uma década, a taxa de nascimento elevou-se a 63% na faixa etária de 35 a 39 anos. “Neste cenário, diante de mulheres nesta faixa de idade, que nunca tiveram filhos, ou que queriam ter outros filhos, somos instigados a discutir as possibilidades de gestação após um diagnóstico de câncer de mama”, ressalta a mastologista Thamyse Dassie, membro da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Mastologia Regional São Paulo (SBMSP) e do Departamento de Comunicação da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM).
Para a especialista, o estudo publicado em 4 de maio no New England Journal of Medicine traz como grande contribuição dados mais precisos sobre quando liberar as pacientes para engravidar. Antes mesmo de sua publicação, o trabalho do POSITIVE trial, estudo internacional multicêntrico, conduzido de forma colaborativa pelo Grupo Internacional de Estudos de Câncer de Mama (IBCSG, na sigla em inglês), alcançou grande repercussão entre os especialistas em dezembro do ano passado, no San Antonio Breast Cancer Symposium, considerado o maior congresso mundial de câncer de mama.
Do estudo do POSITIVE trial participaram 516 pacientes com 42 anos ou menos. Neste grupo, 93,4% apresentavam a doença com receptor hormonal positivo em estadios I e II, e o restante, em estadio III. “As pacientes passaram pelos procedimentos preconizados e depois, na fase de bloqueio hormonal, fizeram o tratamento entre 18 e 30 meses, e então foram liberadas para engravidar”, explica Thamyse Dassie.
Das 497 mulheres acompanhadas na pesquisa, 368 (74%) tiveram pelo menos uma gravidez e 317 (63,8%) deram à luz um bebê vivo. No total, nasceram 365 bebês. “Durante todo o acompanhamento, o número de eventos negativos, de recidivas de câncer de mama, foi muito baixo”, informa a mastologista da SBM. “E comparado com outros estudos que optaram pelo tratamento de bloqueio hormonal no tempo preconizado de 5 a 10 anos, não mostrou piores desfechos. Ou seja, não foi errônea a interrupção precoce da endocrinoterapia para liberá-las a engravidar.” O estudo reforça que mais de 70% das mulheres, depois da gestação, voltaram ao tratamento de bloqueio hormonal. “E este é um fato importante: a retomada do tratamento, após a gestação, deve ser orientada com o intuito de concluir o tempo habitual de endocrinoterapia”, afirma.
Embora contribua com dados mais seguros, a pesquisa, segundo Thamyse, apresenta um baixo número de pacientes com estadiamento III. “São apenas 6% neste universo”, destaca. No caso de pacientes mais jovens, a médica lembra ser comum o atraso no diagnóstico, o que pode levar a estadiamentos mais avançados. “Sem dúvida, é um ponto que carece de investigações mais minuciosas”, recomenda.
De acordo com a mastologista, o estudo também reforça entre os especialistas a necessidade da avaliação da fertilidade na etapa de pré-tratamento do câncer de mama. “Neste sentido, consideramos a possibilidade de fazer congelamento de óvulo para que tenhamos maior chance de gravidez após o tratamento”, diz.