Jorge Alves de Lima nos transportou com a mais absoluta perfeição para os dias e ruas daquela época. Vivemos com ele o desespero da morte de centenas e centenas de pessoas lendo “O Ovo da Serpente”. Num intenso e fatigante trabalho de pesquisa nas atas da Câmara Municipal de Campinas, nos arquivos do Centro de Memória da Unicamp, do Correio Popular e do Centro de Ciências, Letras e Artes, sobre crônicas e notícias diárias de jornais da época, o autor traça a cruel trajetória da epidemia que dizimou e aterrorizou toda uma cidade.
Em seu estilo simples, direto de contar as histórias, Jorge faz com que o leitor se transporte até aqueles dias; acompanhe os sofrimentos; conheça os heróis. Agora podemos reverenciar José Paulino, Irmã Serafina, Costa Aguiar e tantos outros que até então eram apenas nomes de ruas. E, quando todos pensavam que o sofrimento tinha acabado, veio o ano de 1890 e com ele o temido retorno da epidemia, que fez mais vítimas, causou mais prejuízos, dilacerou o povo campineiro com mais mortes.
Em “O Retorno da Serpente” somos transportados novamente ao passado como numa máquina do tempo. Passamos a conhecer detalhes da vida de Francisco Glicério e Campos Salles. Somos envolvidos em acontecimentos do cotidiano, mas percebemos o clima de tensão quando a febre amarela retorna. Fatos históricos se desenrolam diante de nossos olhos atônitos, como a ajuda do Governo do Estado, mas, especialmente a do Governo Federal, através do primeiro presidente republicano, Marechal Deodoro da Fonseca, que destina 533 mil contos de réis para o saneamento de nossa cidade.
Ainda como num filme, o autor nos mostra uma série de fatos muito interessantes e curiosos. Já naquela época existiam os agitadores, mas- carados, baderneiros, panfletários. Já se tentava censurar a imprensa. Aumentavam os casos de menores infratores e a polícia era extremamente truculenta e cometia sérios abusos de violência.
A imprensa fluminense ajudou e muito a cidade de Campinas, noticiando, fazendo campanhas, enviando médicos, enfermeiros, farmacêuticos e remédios.
Ao mesmo tempo fatos incríveis aconteciam, como a “prisão de um fantasma” que rondava o cemitério do Fundão, hoje da Saudade. Outra curiosidade é que onde hoje se situa o Monumento túmulo de Carlos Gomes, funcionavam, no mesmo prédio, a Prefeitura, a Câmara, a Cadeia Velha e o Tribunal do Júri. Uma verdadeira loucura.
O Dr. Costa Aguiar faleceu com apenas 32 anos vitimado pela epidemia, depois de salvar tantas vidas. A Irmã Serafina também. O Dr. Ângelo Simões perdeu 4 filhos. Manoel Ferraz de Campos Sales, quarto presidente da República do Brasil perdeu um filho de 20 anos e assim tantas outras histórias tristes daquela época.
Mas a vida continuava e a briga esquentou quando surgiu a ideia de fundar o Partido Católico Campineiro. Em termos de imprensa a cidade estava muito bem servida com 5 jornais em 1.890: Diário de Campinas, A Gazeta de Campinas, Correio de Campinas, A Cidade de Campinas e O Popular.
E essa imprensa noticiava os bárbaros crimes de Jack, o estripador, em Londres, bem como apoiava todo o movimento para manter estudando em Milão a jovem campineira Maria Monteiro (Maestra di Canto) a primeira cantora brasileira a fazer sucesso na Europa. O Presidente Deodoro da Fonseca havia retirado a bolsa que ela recebia de Dom Pedro, o mesmo auxílio que era prestado a Carlos Gomes.
E, para encerrar dois fatos sérios, mas ao mesmo tempo engraçados: em 1.890 foi iniciada intensa campanha ensinando o uso de bacias (vasos) sanitárias nas residências, demonstrando como eram precárias as condições de higiene naquela época e outra notícia dava conta de uma grande confusão com a colônia italiana. Em 12 de dezembro de 1890 um Dom Juan enviou uma carta anônima para uma senhora casada combinando um encontro. Foi armada uma cilada para ele e a polícia avisada. Justamente a polícia estragou tudo, provocou cenas de pastelão, depois de brutalidade, com pancadaria, tiros e prisões.
Creio que O Retorno da Serpente dispense maiores apresentações. Deixe que Jorge Alves de Lima o conduza a esse passeio ao passado. Se emocione, se divirta, aprenda e divulgue. Esse é um livro que merece figurar em toda boa Biblioteca. É história pura, nua e crua. E, se prepare, que ainda vem muito mais pela frente. Boa leitura!
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