Campinas era a mais importante cidade do interior do Estado. A mais séria candidata a se transformar em capital. Agricultura forte, fábricas chegando, assim como a ferrovia e a pujança do milionário ciclo do café. Famílias abastadas com filhos estudando na Europa. Cenas de cinema. Mas, de repente, tudo de transformou em um filme de terror, em algo inimaginável nos idos de 1889: o surto da febre amarela.
Jorge Alves de Lima nos transportou com a mais absoluta perfeição para os dias e ruas daquela época. Vivemos com ele o desespero da morte de centenas e centenas de pessoas lendo “O Ovo da Serpente”. Num intenso e fatigante trabalho de pesquisa nas atas da Câmara Municipal de Campinas, nos arquivos do Centro de Memória da Unicamp, do Correio Popular e do Centro de Ciências, Letras e Artes, sobre crônicas e notícias diárias de jornais da época, o autor traça a cruel trajetória da epidemia que dizimou e aterrorizou toda uma cidade.
Em seu estilo simples, direto de contar as histórias, Jorge faz com que o leitor se transporte até aqueles dias; acompanhe os sofrimentos; conheça os heróis. Agora podemos reverenciar José Paulino, Irmã Serafina, Costa Aguiar e tantos outros que até então eram apenas nomes de ruas. E, quando todos pensavam que o sofrimento tinha acabado, veio o ano de 1890 e com ele o temido retorno da epidemia, que fez mais vítimas, causou mais prejuízos, dilacerou o povo campineiro com mais mortes.
Em “O Retorno da Serpente” somos transportados novamente ao passado como numa máquina do tempo. Passamos a conhecer detalhes da vida de Francisco Glicério e Campos Salles. Somos envolvidos em acontecimentos do cotidiano, mas percebemos o clima de tensão quando a febre amarela retorna. Fatos históricos se desenrolam diante de nossos olhos atônitos, como a ajuda do Governo do Estado, mas, especialmente a do Governo Federal, através do primeiro presidente republicano, Marechal Deodoro da Fonseca, que destina 533 mil contos de réis para o saneamento de nossa cidade.
Ainda como num filme, o autor nos mostra uma série de fatos muito interessantes e curiosos. Já naquela época existiam os agitadores, mas- carados, baderneiros, panfletários. Já se tentava censurar a imprensa. Aumentavam os casos de menores infratores e a polícia era extremamente truculenta e cometia sérios abusos de violência.
A imprensa fluminense ajudou e muito a cidade de Campinas, noticiando, fazendo campanhas, enviando médicos, enfermeiros, farmacêuticos e remédios.
Ao mesmo tempo fatos incríveis aconteciam, como a “prisão de um fantasma” que rondava o cemitério do Fundão, hoje da Saudade. Outra curiosidade é que onde hoje se situa o Monumento túmulo de Carlos Gomes, funcionavam, no mesmo prédio, a Prefeitura, a Câmara, a Cadeia Velha e o Tribunal do Júri. Uma verdadeira loucura.
O Dr. Costa Aguiar faleceu com apenas 32 anos vitimado pela epidemia, depois de salvar tantas vidas. A Irmã Serafina também. O Dr. Ângelo Simões perdeu 4 filhos. Manoel Ferraz de Campos Sales, quarto presidente da República do Brasil perdeu um filho de 20 anos e assim tantas outras histórias tristes daquela época.
Mas a vida continuava e a briga esquentou quando surgiu a ideia de fundar o Partido Católico Campineiro. Em termos de imprensa a cidade estava muito bem servida com 5 jornais em 1.890: Diário de Campinas, A Gazeta de Campinas, Correio de Campinas, A Cidade de Campinas e O Popular.
E essa imprensa noticiava os bárbaros crimes de Jack, o estripador, em Londres, bem como apoiava todo o movimento para manter estudando em Milão a jovem campineira Maria Monteiro (Maestra di Canto) a primeira cantora brasileira a fazer sucesso na Europa. O Presidente Deodoro da Fonseca havia retirado a bolsa que ela recebia de Dom Pedro, o mesmo auxílio que era prestado a Carlos Gomes.
E, para encerrar dois fatos sérios, mas ao mesmo tempo engraçados: em 1.890 foi iniciada intensa campanha ensinando o uso de bacias (vasos) sanitárias nas residências, demonstrando como eram precárias as condições de higiene naquela época e outra notícia dava conta de uma grande confusão com a colônia italiana. Em 12 de dezembro de 1890 um Dom Juan enviou uma carta anônima para uma senhora casada combinando um encontro. Foi armada uma cilada para ele e a polícia avisada. Justamente a polícia estragou tudo, provocou cenas de pastelão, depois de brutalidade, com pancadaria, tiros e prisões.
Creio que O Retorno da Serpente dispense maiores apresentações. Deixe que Jorge Alves de Lima o conduza a esse passeio ao passado. Se emocione, se divirta, aprenda e divulgue. Esse é um livro que merece figurar em toda boa Biblioteca. É história pura, nua e crua. E, se prepare, que ainda vem muito mais pela frente. Boa leitura!
Atendimento à imprensa:
Camilla Bianchessi – (19) 992-225-478
Odair Alonso – (19) 996-052-736