Por mais desagradável que seja a história do príncipe Andrew com Epstein, observadores da família real disseram que o caso não representa uma ameaça grave
LONDRES - A monarquia britânica está em um ponto de virada. A rainha Elizabeth II, 93 anos, está entrando para a história enquanto seu filho e herdeiro, príncipe Charles, age no sentido de consolidar seu controle. A violenta reação à entrevista do príncipe Andrew à televisão, comentando sua amizade com o financista Jeffrey Epstein, condenado por pedofilia, lançou um poderoso holofote na gestão da "firma" (como os entendidos costumam se referir à família real) com a rainha à frente. Mostrou também de maneira dramática como o príncipe Charles assumiu efetivamente a posição de herdeiro do trono.
Faz tempo que o príncipe Charles defende uma família real mais simplificada, com um menor número de membros envolvidos em funções públicas. Mas a crise envolvendo o príncipe Andrew é o sinal mais visível até o momento indicando que essa mudança teve início.
Valentine Low, que cobre a família real para o Times de Londres, disse que sob o comando da rainha, “há uma série de entidades diferentes na família, que funcionam como grupelhos". “Andrew é a cabeça de um grupo menor”, disse ele. “Mas, ocasionalmente, surge uma crise que só pode ser superada por uma liderança central.”
Após a reação à entrevista cedida à BBC, na qual o príncipe Andrew não demonstrou empatia pelas vítimas adolescentes de Epstein e apresentou desculpas dúbias para a própria conduta, Andrew emitiu um pronunciamento no qual declarava ter pedido à mãe que lhe permitisse “um afastamento das funções públicas pelo futuro previsível, permissão que ela concedeu".
O episódio expôs um paradoxo: enquanto o Palácio de Buckingham faz preparativos para a morte da rainha e a coroação do príncipe Charles, sua forma de lidar com o episódio do príncipe Andrew mostra que a família real está menos preparada para lidar com os problemas que continuam surgindo.
Por mais desagradável que seja a história do príncipe Andrew com Epstein, observadores da família real disseram que o caso não representa uma ameaça grave. Com exceção de possíveis consequências jurídicas da investigação de Epstein, o mais provável é que o príncipe Andrew seja esquecido.
“Eles agiram rápido para resolver a situação à sua maneira, implacável e à sangue frio, como sempre fizeram", disse Low.
A crise eclodiu em um momento em que, paralisados pelo Brexit, os líderes políticos da Grã-Bretanha não estão em posição de ajudar. O colunista e autor Simon Jenkins comparou as gafes do príncipe Andrew aos escândalos de uma celebridade de Hollywood. Para ele, o caso seria “absolutamente irrelevante” para um país que logo deve ir às urnas em uma eleição que terá profundas consequências para o papel desempenhado pelo país no mundo.
Para os observadores da família real, o Palácio de Buckingham deveria se preocupar mais com o príncipe Harry e a mulher, Meghan, duquesa de Sussex. Os relatos de desgaste entre ele e o irmão, príncipe William, e todas as dificuldades de Meghan na adaptação à nova vida são mais prejudiciais, pois esses jovens de sangue azul representam o futuro da dinastia Windsor, e não seu turbulento passado. “Se eles se afastarem da família", disse a biógrafa real Penny Junor, “isso teria implicações reais para o futuro da monarquia". / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL