Os filhos sempre irão desejar ver os pais juntos e, naturalmente, em harmonia, sendo que o primeiro vínculo do bebê é estabelecido com a mãe e, posterior e gradualmente, vai se estendendo ao pai, de modo que ambos, em seus distintos mas igualmente importantes papéis, proporcionam amor e cuidados à criança.
Por outro lado, permanecer em um casamento em que predominam o desrespeito, as brigas, o ódio e a mágoa, parece impossível e, muitas vezes, torna-se de fato. E, então, chega o divórcio como única solução, sobretudo quando não há a possibilidade de ter alguém (profissional ou líder religioso sensato e imparcial) como mediador de conflitos deste casal, desta família.
Muitas vezes, um dos dois não deseja a separação e a proposta do outro pode lhe parecer insuportável, apesar de toda a perda da saúde desse vínculo e de toda dor que a permanência na união esteja trazendo. Com isso, os momentos de raiva do cônjuge que não aceita separar-se tornam-se uma relação permeada pelo ódio e mesmo tentativas de fazer com que quem lhe trouxe tamanho desapontamento sofra as conseqüências disto, que é sentido como um abandono cruel e descabido.
E como ficam os filhos após uma separação como esta? Eles, assim como os pais, mas sob um prisma totalmente diferente e talvez com bem maiores complexidades, precisam dar conta de um processo de luto, nem sempre tão fácil. Algo muito comum é que a interferência dos desentendimentos dos pais continue acontecendo, mas agora com mais uma tarefa a ser cumprida: cuidar, dentro de si, de compreender, no sentido mais profundo, a nova configuração familiar e elaborar, em suas próprias possibilidades e em seus próprios limites, a perda daqueles pais, em alguma medida.
Novos personagens surgem em suas vidas: o namorado/marido da mãe e a namorada/esposa do pai, os quais passam a interferir diretamente na vida da criança, trazendo-lhe mais um desafio: compreender e elaborar mais esta configuração familiar. As mudanças são sensíveis e muito raro nos parece que elas não tragam crises psíquicas, principalmente se os pais, por um motivo ou outro, não puderam elaborar dentro de si mesmos a perda do casamento.
Leticia Kancelkis
Coluna Psicologia
Formada em Psicologia desde 1999, Mestre e Doutora em Psicologia Clínica de referencial Psicanalítico pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC Campinas). Autora dos livros: “O Sol Brilhará Amanhã: Anuário de uma mãe de UTI sustentada por Deus” e “Uma menina chamada Alegria”. Atua como Psicóloga Clínica, atendendo também por Skype. Contato:leticia.ka@hotmail.com