Qual o peso que damos à leitura nos dias de hoje? Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

“A diferença entre o que fazemos e aquilo que somos capazes de fazer bastaria para solucionar a maioria dos problemas do mundo”. Ghandi

Qual o peso que damos à leitura nos dias de hoje?

A leitura exige tempo e dedicação. Adquirir informação, processá-la e a partir de então emitir uma opinião demanda energia, brio.

No meio acadêmico, muitas vezes ficamos reféns de títulos, escolas de pensamentos, partidos políticos. Eu particularmente acho isso muito triste. A liberdade de pensamento está entre as principais formas de liberdade quando pensamos no desenvolvimento como liberdade.

Creio que as escolas de pensamentos nos ajudam a nortear nossas preferências. Como economista estudei diversas escolas de pensamento econômico e dentre essas acompanho até hoje a evolução dos estudos. E muita coisa boa brota de todo lugar. E posso dizer com satisfação que leio tudo que me interessa sem preconceito, essa é a liberdade que tenho, e que cultivo com muito alento.

Mas o cenário hoje em dia me parece tão conturbado que as pessoas não têm mais tempo para ouvir, ler ou interpretar nada que não lhes agrade prontamente. Os algoritmos, personagens, contas, canais, revistas e jornais parecem nos escolher assim como os escolhemos, vivendo numa bolha onde toda informação é verdadeira e combativa, claro, da oponente.

Arun Ghandi, neto de Mahatma Ghandi descreve no livro “A virtude da raiva” um episódio de um que menino gostava muito de doces, por isso os comia em grande quantidade. Por causa disso, começou a adoecer. Por mais que seus pais dissessem a ele para que parasse de comer doces, ele não dava ouvidos. Sempre que havia doces por perto, ele simplesmente apanhava alguns para comer quando não havia ninguém olhando. Preocupada, a mãe do menino levou-o até Gandhi e pediu-lhe que conversasse com ele para que não comece mais doces. Após ter ouvido a mãe, Gandhi disse: "Por favor, volte dentro de quinze dias e eu conversarei com ele."

Perplexa, ela fez exatamente como foi pedido e retornou quinze dias depois. Gandhi chamou o menino num canto e não levou mais do que um minuto para conversar com ele. Isso foi o bastante. Surpreendentemente, a partir daquele momento o menino parou de comer doces. A mãe do menino ficou confusa, imaginando que tipo de milagre Gandhi havia efetuado em seu filho. Alguns dias depois, ela foi até Gandhi perguntar o que havia acontecido. Gandhi respondeu que não havia sido um milagre: "Eu pedi para que a senhora voltasse dentro de quinze dias" disse ele, "porque eu precisava parar de comer doces durante quinze dias para poder pedir ao seu filho que parasse também".

O que podemos aprender com essa lição? Que antes de querer ditar o que é certo aos outros, precisamos rever nossas atitudes, em qualquer situação, até mesmo ao emitir uma opinião, que deve ser construída através de experiências adquiridas (seja na prática ou no estudo) e não virar papagaio de alguém. Conhecer os dois lados da moeda é essencial quando se quer defender ou atacar uma delas.

 

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Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com