Nenhum homem é uma ilha - Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

Na semana passada falamos sobre os Nudges, mais especificamente no âmbito governamental, onde um “Paternalismo libertário” tem o papel de influenciar as escolhas do agente econômico, ao mesmo tempo em que preserva sua liberdade.

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Nudges seriam, portanto, um empurrãozinho ao nosso sistema de funcionamento cerebral que tem de lidar com pequenas e grandes decisões diariamente. Nossas escolhas não estão, então, somente restritas ao âmbito econômico, tais como qual seguro saúde contratar ou qual a melhor maneira de programar a previdência. Do momento em que acordamos e escolhemos sobre colocar o despertador no modo soneca ou não, nosso cérebro começa a gastar energia com escolhas. Ao longo do dia, se não nos programamos anteriormente para as escolhas mais “banais”, tais como qual roupa vestir ou qual será o cardápio do jantar, podemos perder uma quantidade de energia que nos leva cada vez mais a pensamentos intuitivos e não racionais.  Nessa linha de pensamento entra a questão do hábito. Uma ação se torna um hábito a partir do momento em que não precisamos “pensar” para fazer algo, é simplesmente “automático” pois já se tornou um hábito. Assim nossa cabeça poupa energia. Não vamos entrar no mérito dos bons e maus hábitos, mas podemos dizer que uma cabeça exausta pode levar a decisões piores.

Um exemplo pode ser a escolha do cardápio do jantar de sexta-feira. Se você não programou nada, não realizou as compras de supermercado com antecedência, sai do trabalho e descobre que se quiser cozinhar terá de fazer compras, chegar em casa cozinhar para então comer, com certeza estará mais suscetível a sucumbir a um aplicativo de entrega de comidas, mesmo não querendo, mesmo tendo jurado de pés juntos começar uma dieta mais saudável na segunda feira que já passou. Se você se identificou, não se entristeça, todos somos influenciados. A maneira, porém, em que isso acontece, muitas vezes está longe de seu pensamento racional. Nossas escolhas diariamente são influenciadas, pela sociedade, pelo clima, pelo sistema econômico, pela vizinhança, pela família, pelas amizades, e a lista se estende infinitamente. Quer dizer que ninguém é “original” em suas escolhas? Como fica a questão do individualismo? Somos todos individuais e originais, porém influenciados. Como diria John Donne “Nenhum homem é uma ilha, completo em si próprio; cada ser humano é uma parte do continente, uma parte de um todo”.

Aqui entra uma questão importante, dos contemporâneos influencers. Seria um influenciador das redes sociais um arquiteto de escolhas? Sim, de certo modo. A partir do momento em que a sociedade se rearranja de maneira a consumir mais conteúdo das redes sociais, o influencer dá aquele empurrãozinho para que você consuma um produto, uma ideia, um estilo de vida ou uma nova dieta. Se essas influências são todas boas? Aí é uma outra questão, mas eu diria que é óbvio que não. Não pelo fato de que exista um interesse por trás da influência “oferecida”, que na maioria das vezes é financeira, afinal todo mundo quer vender seu pão, mas sim porque apesar de não sermos ilhas e sermos influenciados, não somos iguais. Essa é a magia do ser humano.

O que fazer então para tomar melhores decisões? Ser influenciado de maneira mais racional, se é que podemos assim dizer? Cabe a cada um de nós, cabe mais uma vez a nossas escolhas, diariamente, de como queremos viver, quem queremos ser, quais hábitos gostaríamos de abandonar e quais construir. Intenções não são suficientes, é necessário ação, programação, e claro, se possível um “empurrãozinho do bem”, um Nudge.

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Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com