Para que “pensar o capitalismo”? Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

Nos últimos textos falamos um pouco sobre o sistema capitalista e como podemos interpretar a economia e planejar o que deve ser feito como política econômica para elevar o nível de vida dos agentes econômicos, vulgo nós.

O capitalismo trouxe consigo várias consequências, a mais relevante delas, na minha opinião, a desigualdade. Aqui a desigualdade pode ser colocada no nível do capital: existem os detentores do capital e os trabalhadores. Os trabalhadores vendem sua força de trabalho para o capitalista e este faz o capital render e remunera os trabalhadores por seu trabalho.

A renda gerada (tanto a reprodução do capital) quando o salário (do trabalhador) é direcionada para consumo e investimento. Claro que por parte do trabalhador a maior parte é direcionada ao consumo. O capitalista decide se investe mais e gera mais capacidade de produção, tendo de contratar mais trabalhadores e vendendo mais, e assim fazendo a economia crescer. Com algumas pequenas e grandes variações ao longo do tempo, o sistema pode ser assim resumido de modo bem simplista.

A outra forma de desigualdade que podemos observar é a desigualdade social propriamente dita, entre trabalhadores, onde alguns trabalhos têm uma remuneração maior do que as outras. Essas desigualdades somadas levam à desigualdade entre as nações, por isso dizemos que existem sociedades mais desenvolvidas e outras menos.

Qual a batalha de uma economia forte? Torná-la mais rica e menos desigual. A história nos mostrou que algumas sociedades tiveram mais sucesso que outras, e que a infelizmente a desigualdade ainda impera.

A pergunta principal de hoje é: para que pensar o capitalismo? Nós como trabalhadores, ou detentores de capital e principalmente como consumidores temos um papel importantíssimo nessa narrativa. Somos nós os responsáveis, individualmente e coletivamente pela construção da sociedade em que vivemos. O que gostaria de deixar como reflexão esta semana é como podemos pensar o capitalismo através de nosso consumo? Como o consumo é ou pode ser compatível com a desaceleração que o mundo demanda frente às mudanças climáticas? Os produtores querem realmente se engajar em uma produção mais consciente e menos expansiva? Será essa “consciência” somente mais uma jogada de Marketing para fazer você pensar que consumindo isso ou aquilo te faz um indivíduo mais consciente e, portanto, uma pessoa do “bem”? Pensem nisso.

 Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com

Somente o imperfeito é capaz de evoluir - Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

O perfeito já morreu. Tudo tem um começo, meio e fim.

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 A polarização política atual no Brasil e quiçá no mundo é reflexo de acontecimentos e mudanças ocorridas ao longo do tempo. O atual estágio das coisas foi inflamado pelo aparecimento do coronavírus, e as divergentes opiniões tornaram-se mais acirradas a ponto de pessoas estabelecerem verdadeiros “exércitos” nas redes sociais, de combate e falta de educação para com as pessoas com opiniões diversas.   Quais são os reflexos dessa polarização para o futuro do sistema, ou melhor, é essa polarização reflexo das mudanças já antes ocorridas?

As mudanças, porém, parecem seguir um caminho mais conservador, em que tange uma sequência lenta e progressiva de acontecimentos transformadores, que não tão facilmente se fazem notar. Claro que alguém pode contestar, dizendo que a evolução dos últimos anos em termos de tecnologia e ciência, e até mesmo a revolução na saúde, comércio, finanças, transportes, produção etc. foram muito mais perceptíveis. O que quero dizer com o caminho conservador, consequentemente de transformação lenta e progressiva ao abordar a questão do sistema, é apontar que mais uma vez o futuro do capitalismo é colocado em discussão, desta vez sem a utopia de existir um substituto “pronto”.

Para que fique mais claro, gosto da analogia com o a transição do feudalismo ao capitalismo. Sempre me encantou esse tema, dado que o processo não foi imposto de forma revolucionária, não teve data, não teve um líder, um pensador, nada sequer de grandioso, somente o fato que ocorreu na surdina do dia a dia, das pequenas transformações, aos poucos, de maneira bem conservadora, e durou muito tempo até que se consolidasse um novo sistema e os personagens assim o identificassem, e sobre eles escreveram, filosofaram, elogiaram e criticaram. Foi então nos apresentado o sistema capitalista, que tanto amor e ódio alimentou ao longo da história.

E é este sistema que evoluiu, e, portanto, é notadamente imperfeito. Somente o imperfeito é capaz de evoluir, o utópico perfeito já morreu antes mesmo de nascer. E o que tudo isso tem a ver com polarização política? Nada. Só me pego pensando por vezes que talvez na superfície estejamos todos tão preocupados com isso que não notamos a onda de transformação, e depois penso que não temos mesmo como perceber. Somos tão somente imperfeitos como o sistema, e, portanto, temos ainda a capacidade de evoluir. Assim espero.

Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com

Onde entra a fé? Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Chicareli

Lendo as colunas de dois pensadores contemporâneos que admiro, nos jornais de circulação do país, Leandro Karnal e Luiz Felipe Pondé, me deparei com a questão sobre o futuro do capitalismo, assim como a questão do otimismo e pessimismo.

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São certamente temas complexos e interconectados. Há quem diga que com o avançar da idade nos tornamos mais sábios, e a sapiência não vem do acúmulo de certezas durante a vida, e sim do crescente número de questionamentos aos quais nos deparamos ao longo dos anos. Com isso o interesse por temas históricos, filosóficos, psicológicos, ancestrais e econômicos leva inerentemente a soberbia, assim como a melancolia. Nada é de graça, e o sistema capitalista está aqui para nos lembrar que além de pagar, pagamos caro. O dinheiro no final das contas não paga por nossa sanidade mental, tranquilidade e paz. Nesse contexto, Leandro Karnal levanta a questão de George Bernanos: “A única diferença entre um otimista e um pessimista é que o primeiro é um imbecil feliz e o segundo é um imbecil triste”.

Ser jovem requer muita coragem e é normalmente na juventude que encontramos os mais afincos defensores de ideologias. Com o passar dos tempos e das páginas (leitura), ao menos no meu caso, o interesse pessoal desconectado de obrigações acadêmicas e ideológicas se torna mais leve e prazeroso. Os questionamentos são colocados sem necessidade de imediata resposta, sem retaliação, sem retórica.

Pondé apresenta a visão do autor Wolfgang Streeck de que não há nenhuma opção ao capitalismo como forma de sustentação social, o capitalismo democrático não terá como empregar uma população que não compete com robôs e inteligência artificial. Assim como Karnal questiona que otimismo pode estar ajudando o mundo a permanecer como sempre esteve. No caso da educação brasileira, professores ganham muito mal e a grande maioria dos alunos sempre teve um ensino complicado que foi piorado pela pandemia. Que um ou outro possa fazer algo diferente faz parte do desvio-padrão de todo experimento. Todavia, veja: ao dizer que os professores são maravilhosos e agentes do futuro, substitui-se a dignidade material que eles não têm, o apoio que não chega e a realidade dura por uma espécie de ópio entusiasmado.

Ser jovem idealista seria ser um imbecil feliz? Ser mais velho e com maior conhecimento (mais questionamentos) seria ser um imbecil triste? Onde entra a fé em tudo isso? Você já pensou sobre isso ultimamente?

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 Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com


Narrativas – Por que algumas narrativas “viralizam” e outras não? Coluna Economia Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

Shiller em seu mais recente livro, “Narratives Economics” (2019), trabalha a intercomunicação de diversas áreas de estudos, dentre elas neurociência, psicologia e economia. A ideia central de pesquisa da Economia Comportamental, como é chamada, é utilizar outras áreas de pesquisa e incorporá-las à ciência econômica, mais especificamente na tomada de decisões das pessoas. Narrativas são histórias ou ideias que se espalham como doenças. Narrativas econômicas são, portanto, aquelas que afetam o comportamento econômico, tal como uma história contagiante que tem o potencial de mudar a maneira em que as pessoas tomam decisões econômicas, tais como a decisão de empregar mais trabalhadores ou esperar por tempos melhores, de arriscar em um novo empreendimento ou investir em ativos especulativos voláteis. A história do Bitcoin é um exemplo de como uma narrativa viraliza e é extremamente contagiosa, resultando em mudanças substanciais na economia mundial.

Normalmente as narrativas econômicas revelam associações surpreendentes que carregam um caráter emocional considerável, a própria narrativa do Bitcoin traz consigo o catalizador de uma anarquia pacífica e de liberdade, particularmente porque a criptomoeda é considerada livre de controle governamental e empresarial. Mas acima de tudo, ela viraliza porque você não precisa entender o que é Bitcoin para comprar Bitcoin, e inevitavelmente muitas pessoas se interessam e compram Bitcoins porque acreditam que todo mundo atualmente faz exatamente a mesma coisa.

Paul J. Zak, um neuroeconomista demonstrou que narrativas com um toque dramático elevam o nível dos hormônios ocitocina e cortisol na corrente sanguínea de seus ouvintes, em cargas mais altas do que uma narrativa mais “comum”. Como os hormônios desempenham um papel importante em nossas tomadas de decisões, não é de se surpreender, então, que compreender padrões de comportamentos neurológicos faz parte da análise de tomada de decisão do agente econômico.

A pergunta a ser feita é: por que algumas narrativas “viralizam” e outras não? Narrativas são construções que misturam fatos, emoções, interesses e vários outros fatores exógenos que formam a impressão da mente humana.

Uma ferramenta utilizada pelo autor em suas pesquisas na construção da teoria sobre as narrativas é o Google Books Ngram Viewer, que mostra em forma de gráfico a frequência em que um termo, palavra ou frase aparece em livros publicados num determinado período escolhido (a partir de 1800 até os dias atuais). Infelizmente a ferramenta ainda não está disponibilizada em português.

Abaixo vemos o exemplo sobre o Bitcoin, podemos ver o termo Bitcoin apareceu nos livros em inglês nos últimos anos.

Minha sugestão é fazer uma visita ao site e fazer experimentos com os termos desejados. O resultado é no mínimo interessante e nos faz pensar por que algumas narrativas são mais comuns em determinados períodos e outros não. Como o Bitcoin é uma narrativa relativamente nova que ainda está em alta, o outro exemplo que uso é o termo “Depression”, que mostra uma tendência interessante de aumento de recorrência em anos próximos ao período do Crash da Bolsa de valores de Nova York em 1929 e novamente uma tendência de alta a partir dos anos 1950 até um novo ápice em 2012, após a crise financeira com início em 2008, que foi muito comparada com a crise da Grande Depressão dos anos 1930.


Em ambas as epidemias, medicinal e narrativa, vê-se o mesmo princípio: a taxa de contágio precisa exceder a taxa de recuperação para uma epidemia se propagar. Publicado em 2019, o livro perdeu a chance de apresentar seu conteúdo utilizando-se do exemplo de contágio pelo coronavírus (o autor usa o exemplo do Ebola). Talvez assim o livro se tornaria mais “viral” e uma tradução para o português já estivesse publicada.

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 Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com

Sonhos - Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Belanga Chicareli

Sonhos são passagens

para uma viagem

sem quilometragem.

Passamos em túneis

sem perceber

algumas mulheres sonham com anéis

e outras com o amanhecer.

Pessoas pobres sonham em comer

e o político sempre em se abastecer.

Carrego no sonho a esperança

no meu mundo de criança

de tirar a diferença entre pobres e ricos

como favelados e políticos

e lhes impor a semelhança

como minha melhor herança.

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 Este é um texto livre de uma garota de quase 12 anos, na época, em 1992 na sexta série do ginásio. Esta sou eu. Desde que me conheço por gente gosto de ler e escrever. Engraçado que passados quase 30 anos, o texto é atual. Ideologias à parte, creio que ter escolhido o caminho de estudar Economia, História Econômica, ter interesse por Psicologia e Filosofia me levaram a questionamentos mais profundos sobre o real sentido de tudo isso que chamamos vida. Mas enfim, vamos ao que interessa, ao tema polêmico: Finanças.

No senso comum, as pessoas pensam Finanças como algo muito complicado que somente alguns poucos podem entender, aquele pessoal de terno que trabalha em Wall Street, ou nas corretoras de investimentos, popularizadas a um público maior devido a sua exposição nas redes sociais. No caso Brasil, temos atualmente uma fonte abastada em termos de informações sobre investimentos, formação de uma carteira de investimentos, planejamento, e infelizmente também a aposta em ganhos rápidos e sem “muito esforço” de curto prazo, que garantirá sua renda dos cursos picaretas de “Day trade”. Tudo tem seu preço.

Mas afinal o que são Finanças? Como uma Finança bem arquitetada pode levar a uma sociedade melhor. Meu autor favorito do momento, Robert J. Shiller, economista ganhador do prêmio Nobel, tem lecionado e escrito livros sobre o tema já há algum tempo. Shiller defende a ideia de que não somente o Capitalismo enquanto sistema, assim como o Capitalismo Financeiro (atual era do Capitalismo), é capaz de gerar uma sociedade mais igualitária. O pensamento não é tão absurdo quanto parece, somente precisa ser olhado por um outro prisma.

Muitos dos estudos na área de Finanças são focados em estratégias e resultados de curto prazo, tópico relacionado ao gerenciamento de risco, formação de portifólios otimizados de investimentos. Mas isto é somente uma parte do que Finanças realmente envolvem. Segundo Shiller em “Finance and the Good Society”, a solução para o problema está na melhora e democratização das Finanças, servindo assim a um bem maior da sociedade como um todo. As pessoas devem, portanto, ter um acesso mais facilitado a inovações financeiras, e principalmente uma melhor educação financeira. O papel do Governo então, é de fornecer regras claras ao jogo, que protejam os consumidores e que promovam o interesse público geral, permitindo que os competidores façam o que melhor podem fazer: fornecer melhores produtos e serviços. O desafio aqui fica por conta dos espectros dimensionais dessas regras, que deveriam atingir o mais igualitariamente possível uma dimensão internacional, dado que hoje em dia os mercados financeiros são “globais” em alcance e efeitos instantâneos.

O que tudo isso tem a ver com o meu texto livre escrito décadas atrás? Também não sei. Pensando em desigualdades e ideias lembrei-me desse texto. Talvez seja somente uma utopia, a diminuição das desigualdades num ambiente Capitalista (sobretudo financeiro), talvez não. Talvez existam pessoas, que se dediquem ainda a um estudo na área econômica e financeira, que olhe por trás do espelho, e que vislumbre, que talvez o que precisamos na construção de algo melhor, seja uma educação melhor, de base e superior, para servimos assim a sociedade com melhores cabeças. Infelizmente num ambiente tão agressivo de defesas de ideologias, principalmente nas redes sociais, fica chato, além de extremamente cansativo, tentar empreender uma discussão saudável e educada.

 

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Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com

Nudge ou Paternalismo Libertário - Coluna Economia e Comportamento por Tatiana Chicareli

Na semana passada começamos a conversar sobre Nudge.

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Em inglês “Nudge” significa “dar um empurrãozinho, cutucar as costelas, principalmente com os cotovelos”. Nesse sentido, o nudge é o ato de alertar ou avisar gentilmente. Quem cria nudges? Arquitetos de escolhas podem ajudar. A princípio todos podemos ser “arquitetos de escolha”. Um arquiteto de escolhas tem a responsabilidade de organizar o contexto no qual as pessoas tomam decisões. “Se você faz a cédula de votação usada para escolher candidatos, você é um arquiteto de escolhas. Se você é médico e vai explicar as opções de tratamento disponíveis para um paciente, você é um arquiteto de escolhas. Se elabora o formulário de adesão ao plano de saúde que os recém-contratados precisam preencher ao entrar na empresa, você é um arquiteto de escolhas. Se está explicando ao seu filho ou a sua filha que faculdades ele ou ela pode cursar quando terminar o ensino médico, você é um arquiteto de escolhas. Se você é um vendedor, você é um arquiteto de escolhas (mas nesse caso você já sabia).

 Um ótimo exemplo do nosso dia a dia é a disposição dos produtos nos supermercados, a música que toca enquanto você faz compras e os produtos disponibilizados próximo aos caixas. Nem paramos para pensar que a simples disposição possa interferir na nossa escolha, mas quem nunca saiu do mercado com muito mais coisas do que pensou, planejou ou desejou? Detalhes mínimos que parecem insignificantes podem gerar impactos no comportamento das pessoas. Uma arquiteta de escolhas que trabalha na disposição de alimentos no refeitório de uma escola, por exemplo, pode dar um nudge, ou seja, influenciar as crianças a comer de uma forma saudável. Isso é o que Richard Thaler e Cass Sunstein também chamam de paternalismo libertário.

Pensando bem, são conceitos contraditórios. O lado libertário está na convicção de que as pessoas devem ter liberdade de escolhas, para fazer o que quiserem, quando usamos o adjetivo “libertário” para modificar o substantivo “paternalismo”, é apenas no sentido de preservar a liberdade. Os paternalistas libertários querem cada vez mais que as pessoas sigam seu próprio caminho, e não impor obstáculos. O lado paternalista, portanto, legitima arquitetos de escolhas para tentar influenciar o comportamento das pessoas, desde que seja para tornar a vida delas mais longa, mais saudável e melhor. O nudge no setor público e privado seria o empurrãozinho capaz de mudar o comportamento das pessoas de forma previsível sem vetar qualquer opção e sem nenhuma mudança significativa de seus incentivos econômicos.

Nudges não são ordens, são escolhas influenciadas, para que tomemos a melhor decisão, “por nós mesmos”. Afinal, pessoas reais têm dificuldade para tomar sempre as melhores decisões. Muitos podem confundir o paternalismo libertário com inclinações partidárias de direita ou esquerda. Na verdade, os economistas comportamentais acreditam que seja um fundamento promissor para o multipartidarismo. Em muitas áreas, como a proteção ao meio ambiente, o direito familiar e a escolha de uma escola para os filhos, o melhor tipo de governo requer menos coação e limitações governamentais e mais liberdade de escolhas. A proposta é simples, que os governos substituam exigências e proibições por nudges, levando a um Estado não maior, mas, sim, um governo melhor.

 Na semana que vem falaremos mais sobre como o sistema de funcionamento de nosso cérebro é complexo e como os pensamentos intuitivos (automáticos) e reflexivos (racionais) permeiam nossas decisões, e nesse ambiente, continuar falando da importância dos nudges.

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 Tatiana Belanga Chicareli

Coluna Economia e Comportamento

Economista formada pela PUC-Campinas, Mestre em História Econômica pela UNESP, doutora em Desenvolvimento Econômico (História Econômica) pela UNICAMP. Pesquisadora na área de Econômica comportamental e Narrativas Econômicas, com foco no período da Grande Depressão. Escreve sobre economia, escolhas, livros e comportamentos. Email: tatiana.chicareli@gmail.com